Entrelinhas



Eu continuo com essa mania de querer ler o que você não escreveu, ouvir o que você não disse e interpretar um olhar que você não olhou. Acho que aprendi a te decifrar, mas não por completo. E é essa incompletude que me agonia, escarnece meu ser. A indefinição do seu eu é como a cólera. Começa ao tentar contemplar o seu rosto. Seus olhos baixos me evitam. Sinto os primeiros sintomas da moléstia. A dor sai da cabeça e transpassa o coração. Desfaleço aos poucos. Cada atitude camuflada vai decaindo meu quadro clínico. Agora, que pouco te encontro, vivo a te encarar por lembranças. E a doença é bem pior...

Não sei, mas nenhum dos seus gestos me denotam reais. Você esconde. Ou melhor, se esconde. Oculta algo grave em si mesmo. Ninguém pode saber. É segredo guardado no baú de suas entranhas. E que ficará aí por longos anos... Não sei se corre somente de mim ou de quem ocupar o lugar de um 'amor' em sua vida. Mas o fato é que, para mim, sua serenidade não é serena. Sua tranquilidade grita por socorro. Você quer vir, mas uma sombra te impede. Seus ombros carregam um peso invisível. E preso dentro dos medos, constrói um muro ao redor de si. Ninguém entra nessa fortaleza e você é seu próprio (e único) prisioneiro. Triste beleza rústica.

E eu que te amei tão puramente, resgatei os mais belos sentimentos que, como nuvens, pairavam sobre mim e eu não sabia. Sinceramente, achei que conseguiria te desvendar por esse imenso amor. Ainda lembro. Era noite... não relampejava, nem nada. Tudo era calmaria de primavera. De repente, as nuvens se dissiparam e eu me banhei com sua chuva insistente. Desceu torrencial e inundou o meu ser. A água mágica trazia um poder curador, imaginava.  Eu e você, era certeiro aquele destino. Mas não. Deparei-me com um homem de ferro, que me olhava errante pelas frestas da máscara.  

Desde então a minha missão foi tentar arrancar aquela proteção de fora e te descobrir para mim e por você, te ver por inteiro, sem amarras. Vã tentativa! Falha alternativa! Você me impediu, não se abriu, se evadiu o mais rápido que pôde. Foi embora e me deixou com aquele gosto na boca de quem não conseguiu desvendar um enigma. Talvez isso tudo seja devaneios meus sem fundamento. E não exista nada que te separe de você mesmo, e eu tenha me  enganado. Peço perdão se meus instintos e sentidos erraram. 

É que eu sou livro aberto. Sou braços a acolher o que vier. Ando encarando o horizonte. Não temo em levantar os meus olhos. Meu sorriso sai a hora que deseja, sem pestanejar. E te ver assim, por entre a fortaleza de si mesmo me intrigou muito. Parece um casulo sem prazo para virar borboleta. 

Esse além de suas palavras tornou-se meu código indecifrável, que eu já não sei mais se um dia conseguirei decifrar. Nem sei se tenho direito, de saber o que existe entre você e você mesmo. Mas tenho pra mim que se você se abrisse, as coisas se tornariam mais simples. Todavia... tudo bem. Mais do que eu, Deus vai te ajudar a se livrar das grades, se é que é de sua vontade e se é que elas existem mesmo. 

E eu que cuide dessa minha mania de querer ler, ver e ouvir tudo que não foi escrito, mostrado e falado. (...)

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